A publicidade de loterias em toda a Europa está a passar por uma transformação significativa. A pressão regulatória, as preocupações públicas com os danos do jogo e o crescimento das redes sociais mudaram a forma como as lotarias nacionais e operadores privados comunicam com o público. Países como o Reino Unido, Suécia e Países Baixos implementaram controlos mais rigorosos, enquanto as marcas passaram a focar-se em mensagens sociais e influenciadores nas plataformas digitais.
Nos últimos cinco anos, diversos países europeus aprovaram reformas que restringem fortemente a promoção agressiva de produtos de jogo, incluindo loterias. No Reino Unido, a revisão da Lei do Jogo em 2023 resultou na proibição de celebridades e atletas em anúncios de jogos de azar, afetando diretamente as campanhas de loteria. A Suécia, por sua vez, introduziu em 2024 uma exigência legal de “moderação” nas comunicações comerciais, aplicando multas pesadas a quem violar a regra. Já os Países Baixos foram mais longe, aplicando, em julho de 2023, uma proibição quase total da publicidade de jogos em espaços públicos, rádio e televisão, forçando as loterias a migrar para formatos digitais com base em permissões.
Essas medidas visam reduzir a exposição de públicos vulneráveis, especialmente menores e pessoas com risco de dependência. Agora, os reguladores exigem que os anúncios evitem retratar o jogo como um caminho para o sucesso ou melhoria de vida e que incluam advertências visíveis. Operadores que não cumpram podem enfrentar multas ou até suspensões temporárias da licença.
Consequentemente, os canais tradicionais perderam eficácia, levando o setor a adotar estratégias digitais que se alinhem melhor com os regulamentos e as expectativas sociais. As campanhas actuais destacam a transparência, o jogo responsável e mecanismos de proteção ao jogador.
As empresas operadoras de loteria estão a adaptar rapidamente as suas abordagens. Muitas priorizam agora a confiança da marca no longo prazo em vez de resultados imediatos de vendas. No Reino Unido, a National Lottery passou a investir em projectos culturais e comunitários como forma de promover-se. A Svenska Spel, na Suécia, substituiu a comunicação focada em prémios por mensagens centradas na responsabilidade e ética. Nos Países Baixos, operadores locais firmaram acordos com entidades independentes para auditar campanhas publicitárias e verificar padrões éticos.
Outro movimento crescente é a separação entre a identidade da marca e a promoção directa de produtos. Em vez de anunciar prémios, os operadores destacam como as receitas são aplicadas – por exemplo, em sectores como a saúde e educação. Isso reduz a pressão sobre os consumidores e posiciona as loterias como contribuintes para o bem público.
Essa mudança implicou reestruturações nos departamentos de marketing, formação jurídica e reformulação das estratégias criativas. Agências especializadas em publicidade de jogos estão agora a transformar-se em consultoras de comunicação ética.
Com as restrições aplicadas aos meios tradicionais, as loterias apostaram fortemente nas redes sociais – especialmente TikTok, YouTube e Instagram – para atrair novos públicos. A aposta é especialmente dirigida às gerações mais jovens, que consomem conteúdos maioritariamente por telemóveis e não assistem a canais tradicionais. Os influenciadores desempenham um papel central nestas campanhas, embora a sua atuação também esteja sujeita a normas.
As diretrizes britânicas de 2024 proibiram a promoção de produtos de jogo por influenciadores com menos de 25 anos ou que tenham audiências juvenis. Na Suécia, há exigências explícitas de transparência e proibição de conteúdo que associe o jogo a um estilo de vida idealizado. Ainda assim, operadores encontraram formas criativas de utilizar influenciadores alinhados com causas sociais e campanhas educativas.
Os formatos interactivos – como transmissões em direto, bastidores de projectos sociais ou perguntas e respostas com vencedores – são cada vez mais comuns. Estes conteúdos envolvem a audiência e reforçam o papel das lotarias como agentes de interesse nacional, não apenas fornecedores de jogos de azar.
Nos Países Baixos, a Postcode Lottery lançou, em 2025, uma campanha com micro-influenciadores que destacavam como os fundos da loteria eram usados em projetos locais. O conteúdo evitava promoção directa, focando-se em testemunhos autênticos, e obteve grande envolvimento online. Na Suécia, a Svenska Spel produziu pequenos documentários no YouTube sobre os impactos positivos do financiamento desportivo juvenil.
No Reino Unido, uma colaboração entre uma activista ambiental e a National Lottery gerou ampla atenção ao mostrar projetos ecológicos financiados pela loteria. Este tipo de storytelling aumenta a confiança do público e reforça a imagem institucional das operadoras de loteria.
Estes exemplos ilustram a viragem do marketing direto para uma abordagem editorial e informativa, mantendo a visibilidade da marca sem recorrer à promoção agressiva.
A principal transformação recente é a incorporação da responsabilidade social corporativa nas estratégias de comunicação das loterias. Estas entidades já não são apenas vistas como fornecedoras de entretenimento, mas também como instituições com deveres éticos. Este movimento ganhou força após a pandemia de COVID-19, que intensificou a pressão sobre operadores acusados de explorar situações de vulnerabilidade.
Hoje, muitas campanhas incorporam mensagens éticas de forma explícita. Na Dinamarca e Noruega, as publicidades incentivam pausas reflexivas antes da compra. Na Alemanha, as lotarias colaboram com instituições de saúde pública para promover mensagens de responsabilidade financeira. O objetivo é alterar a perceção pública: de recompensa individual para benefício coletivo.
Outros temas comuns incluem inclusão, saúde mental, sustentabilidade e literacia digital. Estas mensagens alinham-se com os valores da sociedade atual e ajudam a integrar as lotarias nas prioridades nacionais. Ainda que parcialmente motivadas por obrigações legais, estas campanhas refletem uma adaptação real às expectativas da população.
Os primeiros dados são promissores. Segundo um relatório de 2025 da Gambling Commission do Reino Unido, a confiança pública na National Lottery aumentou 14% em dois anos após as mudanças nas campanhas. Na Suécia, mais de 60% dos entrevistados consideram a Svenska Spel como uma entidade responsável.
Contudo, campanhas de fachada têm sido criticadas. A autenticidade é crucial: uma campanha que promove apoio ao desporto local deve ser acompanhada de provas documentais e auditorias externas. Caso contrário, será vista como greenwashing.
Em suma, o sucesso da publicidade ética depende de consistência a longo prazo, práticas reais e uma ligação clara entre mensagem e ação. Mais do que promover vendas, a comunicação torna-se um instrumento de legitimidade e confiança pública.